Górgias é o segundo volume dedicado a Platão que a editora Perspectiva traz ao leitor brasileiro em sua coleção Textos (depois da República). Traduzido diretamente do grego por Daniel Lopes, autor das notas e do ensaio introdutório, este diálogo aparece no catálogo de Diógenes Laércio (séc. II d.C.) e nos manuscritos medievais com o subtítulo “Sobre Retórica”. Todavia, o leitor que se aventura pelos caminhos dialógicos percorridos pelos interlocutores logo constata que a discussão vai além da tentativa de definir o que é essa arte, ou mesmo se ela é verdadeiramente uma arte. À medida que o exame conduzido por Sócrates passa de uma personagem a outra, emerge a questão fundamental que é a do melhor modo de se viver: será a vida política da democracia ateniense, da qual a retórica é parte imanente, ou a filosófica, na imagem de Sócrates construída por Platão? O desafio socrático é persuadir de que a justiça é superior à injustiça e que a felicidade humana está na vida virtuosa. Nesse viés moral, a pergunta é: qual a utilidade da retórica? Concebida por Górgias, Polo e Cálicles como meio de alcançar uma existência afortunada através do poder e da liberdade, ela é, para Sócrates, instrumento para a prática da injustiça no âmbito político. O debate aponta, portanto, para uma crítica mais ampla de Platão à democracia, uma vez que dela se gera o antípoda do filósofo, o tirano, como se lê na República.
Daniel R. N. Lopes
É doutor em grego clássico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professor de língua e literatura gregas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCHUSP). É autor do livro Xenófanes de Cólofon: Fragmentos (Olavobrás, 2003) e colaborou com a edição de A República de Platão (Perspectiva, 2006). Tem se dedicado prioritariamente à tradução de diálogos de Platão, e aos estudos sobre filosofia antiga, historiografia e oratória gregas.
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